Maranhensidade: um estado de alegria
por Joãozinho Ribeiro
Neste primeiro contato do ano com os leitores desta coluna, aproveito para fazer uma oportuna e respeitosa retificação de autoria, e atribuir os créditos do irretocável artigo da semana anterior (07/01), intitulado “Nossa Singela Homenagem aos Serelepes”, ao camarada da vida & da arte – ZEMA RIBEIRO. Pois, em virtude de momentânea ausência da Ilha, não tive meios materiais para elaborar a respectiva redação e solicitei a valiosa colaboração do parceiro, no que fui prontamente atendido.
Feitos os devidos reparos e reconhecimentos dos direitos morais, após a realização de um Natal recheado de programações artísticas por todos os cantos da cidade, e de um Reveillon ecumênico e multicultural, 2008 se anuncia como um ano de singulares celebrações de datas altamente significantes para a história do nosso Estado, do País e do Planeta:
– 40 anos do “68” (passeata dos 100 mil, tropicalismo e roda viva, censura e AI-5, barricadas de Paris, Primavera de Praga, protestos contra a Guerra do Vietnam, assassinatos de Luther King e Robert Kennedy, Apollo 8 em órbita da Lua…)
– 50 anos da Bossa-Nova
– 200 anos da vinda da Corte Portuguesa ao Brasil
– 400 anos do nascimento do Padre Antonio Vieira
– 170 anos da revolta da Balaiada
– 100 anos da Academia Maranhense de Letras
Motivos não faltarão para afirmação da nossa maranhensidade e sua conexão com o Brasil e o Mundo. Por falar nisso, sei que esta expressão ainda incomoda muitos ouvidos, principalmente quando se torna alvo de interpretações obtusas, desprovidas do mínimo de observância ao conteúdo dos ensinamentos do professor Milton Santos: “no global está a aparência; no local, a essência”. Ou nos versos do poeta e compositor Josias Sobrinho: “Com o rumo voltado pra dentro e aberto pro mundo todinho!”.
Maranhensidade é carnaval e academia; são joão e literatura; educação e cultura; turismo e tecnologia; intercâmbio e identidade; pertencimento e trocas; tolerância e diversidade; música e magia; conhecimento e universalidades; saberes e fazeres; direitos e liberdade para exercê-los: à livre expressão e manifestação artística, jornalística, do pensamento; enfim, do engenho e arte daquilo que temos de melhor para contribuir com a cultura da paz e com o reencantamento da Humanidade.
Bandeira branca! Para que o Carnaval da Maranhensidade 2008, a exemplo de 2007, seja um “Estado de Alegria”, transbordante de paz e solidariedade entre os empolgados foliões, e também entre aqueles que preferem a tranqüilidade e a meditação dos retiros religiosos e espirituais.
Abram alas! Para que a negritude da nossa maranhensidade possa se espraiar por todos os cantos e cânticos, e revelar a percussividade da a nossa alma criadora e hospitaleira a todos que vierem compartilhar conosco da primeira grande festa popular do ano; e que tudo isso possa também se traduzir em trabalho, tributos, alegria, renda e cumplicidade cultural.
Nas cidades que cultivam estes tradicionais festejos, que a festa seja pública e democrática, sem aproveitamento das circunstâncias para beneficiar as conveniências político-eleitorais de quem quer que seja. Pois este é o principal fundamento do Edital Público do Carnaval da Maranhensidade 2008; forma legal e legítima de celebração de convênios com os Municípios de todo o Estado, visando o repasse de recursos para apoio às suas respectivas programações.
Este ano, com a novidade da introdução de dois requisitos básicos para habilitação dos proponentes para inscrição no Edital:
a) Eleição de uma Comissão Organizadora do Carnaval, por cada município, com um máximo de 12 componentes, escolhidos entre os representantes das agremiações carnavalescas e personalidades da cultura local, devidamente registrada em cartório;
b) Destinação dos recursos repassados pela SECMA, única e exclusivamente, para a contratação de bandas, blocos, brincadeiras e artistas maranhenses.
Além destes requisitos, uma expressa recomendação para a inclusão na programação de segmentos merecedores de especial atenção: crianças, idosos, portadores de deficiência. No detalhamento do Plano de Trabalho, integrante do Formulário de Inscrição, a exigência de uma discriminação minuciosa dos nomes de todas as brincadeiras e artistas contratados e os valores dos seus respectivos cachês.
Com este elenco de medidas, a parceria dos municípios e a fiscalização da sociedade, através das respectivas Comissões Organizadoras do Carnaval (além dos atentos olhares do Ministério Público), tenho certeza que estaremos dando acertados passos para a transformação destas nossas grandes festas populares em momentos propiciadores de geração de trabalho, renda e alegria para a nossa população; ao invés do patrocínio a um dantesco espetáculo de evasão de recursos públicos e o desprezo pela nossa produção cultural, portadora da maior diversidade do Brasil.
Confirmando a tese exposta neste artigo, gostaria de finalizá-lo com uma reflexão do colega e atual Secretário de Cultura do Estado da Bahia, Márcio Meirelles, que em 2007 iniciou uma duríssima campanha para acabar com a hegemonia da “cultura do espetáculo” do carnaval baiano e com a desvalorização da cultura dos municípios:
“É uma situação viciada. É complicado mudar a cultura da Cultura. Já existe a cultura de dependência e sabemos que existem blocos que não têm representatividade, que apenas vêm atrás dessa pequena verba, assim como existem outros sérios que trabalham o ano inteiro. Vamos incentivar cada município que tenha carnaval tradicional para que a festa não caia nessa homogeneização”.
P. S.: Registro aqui, com sincera satisfação, as elogiosas palavras do cantor Gargamel (ex-Banda Ilha) aos critérios adotados para a contratação de artistas; mais ainda, por me revelar, em breve conversa no Aeroporto Cunha Machado (dia 10/01), que já se encontra com a agenda para o Carnaval 2008 totalmente preenchida, fato que confirma o acerto da atual política do Governo do Estado do Maranhão. Oxalá, um dia possamos ter depoimentos semelhantes do maior número de segmentos culturais espalhados por todos os municípios do nosso querido Maranhão.
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acima, o texto de joãozinho ribeiro, no jornal pequeno de hoje; abaixo, o texto cujos créditos ele nos dá, publicado em sua coluna de segunda-feira passada, no mesmo jp.
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Nossa singela homenagem aos serelepes
por Zema Ribeiro
Sanfoneiros são alegres
Tocam Mahler, Mozart, Liszt
Wagner, Schubert, Weber e Verdi
Brahms, Strauss, tocam Tchaikovsky
Músicas de faroeste
Tocam sax fazem chiste
Verás casos apliques teste
Sanfoneiros se divertem
Só poetas seguem tristes
Levantam o pó no Nordeste
Desfilam todos os hits
No balet, no baile os foles
Rasgam mambo, blues, maxixes
Dominguinhos manda um rap
Já Sivuca Stravinsky
Oswaldinho vai de rock
O Hermeto de suíte
E a máxima persiste
Sanfoneiros serelepes
Só poetas seguem tristes
A letra acima, de “Sanfoneiros Serelepes”, parceria de Ná Ozzetti com o genial Itamar Assumpção, é nossa singela homenagem ao grande José Nunes de Sousa, o Nunes do Acordeom, que subiu para tocar no forró de Januário, Luiz Gonzaga, Sivuca e tantos outros mestres.
Certeira a letra, a ida do sanfoneiro desta para outra, deixa triste este poeta e, certamente, todos aqueles que lhe conheceram. Mas seguimos.
Ná e Itamar já citam um lote de gênios na composição, aos quais juntamos uns poucos outros neste texto feito de tinta e lágrimas, cometido com a dor da surpresa desagradável para um começo de ano que queremos melhor do que o passado.
Preferíamos que a notícia de um acidente de trânsito na última página do Jornal Pequeno dominical fosse uma ficção de Valêncio Xavier – que fez de crimes e de suas respectivas coberturas jornalísticas, literatura da melhor qualidade.
Antes, um pesadelo, do qual acordaríamos a qualquer hora, que a realidade nua e crua a nos esbofetear: conduzindo sua Kombi, retornando de sua Pirapemas natal à São Luís que o acolheu, Nunes do Acordeom, por volta do meio-dia de sábado, foi ver “Lua”.
Sua querida figura era facilmente vista em debates culturais diversos – seminários, fóruns, conferências etc. Foi Nunes do Acordeom um dos que levou o poeta-músico Zé Maria Medeiros a iniciar o hoje mais que consolidado movimento cultural conhecido de todos nós batizado “A vida é uma festa!”.
“Zé, por que não te apresentas?”, foi a pergunta-intimação do sanfoneiro que, reza a lenda, serviu de pontapé inicial para a festança semanal que caminha, em 2008, para seis anos de existência ininterrupta, sempre às quintas-feiras, na Praia Grande.
Por tudo isso, e apesar do vasto leque de assuntos que temos por tratar – sempre, presto esta, como já disse, singela homenagem a Nunes do Acordeom, que certamente merece muito mais.
Hora dessas, depois de saudar e tocar com velhos e grandes mestres, Nunes do Acordeom empunha sua sanfona e manda ver um belo “Parabéns a você” para o parceiro Gerô, certamente acompanhado por um coro angelical. Estivesse por aqui, nosso querido “língua-afiada” teria completado mais um ano de vida, ontem. A ele, também, nossas sinceras e singelas homenagens.
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